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Modos e Modas é o blog da Jornalista Deise Sabbag. Inspirado nas tendências com possibilidade de alcançar as ruas e focado nas tendências adequadas ao biotipo brasileiro. Deise é autora de três livros: “A Moda dos Anos 80”, “Na Moda de Corpo e Alma”, e “Beleza e Qualidade de Vida de A a Z”, glossário reunindo os principais verbetes do setor.
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Peça Aponta Dicotomia entre a Realidade Pessoal e o Papel Social

Written By Deise Sabbag on quarta-feira, 2 de outubro de 2019 | outubro 02, 2019



O espetáculo Jardim de Inverno é adaptado do romance “Revolutionary Road”.  A peça se passa em uma época pré-feminista e levanta questões como a liberdade, os padrões de vida impostos pela sociedade e a sensação de sufocamento na vida familiar. A obra foi adaptada para o cinema (em português com o título Foi Apenas Um Sonho), protagonizada por Leonardo DiCaprio e Kate Winslet. 

A trama retrata a vida cotidiana de April Wheeler (Andréia Horta) e seu marido Frank (Fabrício Pietro), um casal de classe média aparentemente feliz, que mora com seus dois filhos em um subúrbio de uma pequena cidade nos Estados Unidos, na década de 1950. A história revela momentos da vida cotidiana do casal. Ao cumprir as convenções sociais impostas, ambos são acometidos por frustração, conforme assistem  suas vidas passam como um acúmulo de instantes sem sentido. 

 “A obra, mesmo tendo sido escrita no início da década de 60 e contando a história de uma família americana suburbana dos anos 50, carrega uma atemporalidade, já que  fundamentalmente expõe  como nossos projetos de realização pessoal podem ser sufocados em nome da estabilidade social e financeira. Esse assunto não diz respeito a uma época específica, e sim à problemática humana mais profunda, independente de tempo ou lugar”, explica o diretor Marco Antônio Pâmio.

Nessa época pré-feminista, April é uma dona de casa que tem o sonho de ser atriz frustrado.  Ela elabora um plano romântico para se mudar com a família para Paris, onde será possível reavivar seu relacionamento com o marido, cumprindo seu profundo desejo de liberdade e dando a ele a chance de se “encontrar”.


Andréia Horta  está feliz com o novo trabalho: “Sinto a alegria de já ter vivido muitos personagens, com alguns tenho semelhanças,  com outros não. Sempre tentamos encontrar pontos de contato, mas nem sempre acontece, o que é bom também, porque, a partir do desconhecido, começa a criação. Para April, tenho me conectado com tantas histórias de pessoas que viveram sufocadas pela idealização da família e do papel que acreditaram que as  mulheres deveríam ocupar ,  sem chance de escolher outro destino”, relata.

Já Frank tem um emprego relativamente bem remunerado, mas muito tedioso, e espera conseguir em breve uma promoção. Inicialmente, ele fica entusiasmado com a ideia da esposa, mas, aos poucos, passa a sabotá-la, alarmado com a possibilidade de mudança, pois acredita que precisa encontrar a felicidade em sua vida concreta.


Para construir sua personagem, Fabrício Pietro inspira-se nos modelos de família tradicional ao seu redor. “Fui criado em uma sociedade na qual a figura masculina tem obrigação de ser forte, provedora, chefe da casa  e bem-sucedida. Ainda que eu tenha consciência destas questões e lute contra elas, sei que estão plantadas no meu DNA social”, acrescenta.

O casal não sabe se abre mão de seus verdadeiros desejos ou se enfrenta o peso do conformismo. Ambos  descarregam suas frustrações um no outro e raramente compreendem o ponto de vista do parceiro, refletindo a desilusão do sonho do “american way of life”. Mas, diante dos olhares de seus vizinhos, eles representam os pilares de tudo o que há de bom; são pessoas contagiantes, exemplares e especiais.

Andréia Horta e Fabricio Pietro
Fotos: Danilo Borges

Essa dicotomia entre a realidade (para o casal) e a ficção (para os vizinhos) faz com que a história seja um inquietante retrato da busca pela oportunidade  de  fazer o que se quer para que tudo valha a pena. “A própria dramaturgia nos conduz a isso, uma vez que enxergamos o casal na sua intimidade e no convívio com os outros personagens que os cercam. Nosso elemento inspirador é o próprio teatro, na medida em que a vida dos dois é, de certa maneira, representada para os outros. Todos representam papéis sociais, mas o que eles vivem entre quatro paredes se distancia bastante do que deixam transparecer para o mundo. E, tanto quanto no teatro, esses papéis precisam ser extremamente bem representados”, explica Pâmio.

Tal como uma tragédia grega, a obra gira ao redor das falhas morais de suas personagens centrais ao discutir temas como a liberdade, o quanto as pessoas são capazes de se autossabotar para caber nas expectativas sociais, a distância entre a felicidade idealizada e a vida concreta, a busca por uma vida autêntica, os modelos irreais de felicidade impostos pela sociedade, como o homem lida com o sucesso da mulher, seu desejo de autoafirmação e o medo diante de certezas questionadas.

Questões femininas

Publicado em 1961, o primeiro romance de Yates foi finalista do National Book Award em 1962, vendeu milhares de cópias, foi traduzido e publicado em outros países e, em 2005, foi eleito pela revista Time como um dos 100 maiores livros da literatura em inglês. A obra ficou ainda mais conhecida graças à adaptação cinematográfica dirigida por Sam Mendes em 2008, com o título Foi Apenas um Sonho, estrelada por Leonardo DiCaprio e Kate Winslet. 

“Quando assisti ao filme em 2009, senti o mesmo vazio desesperador e vontade de resgatar uma certa ‘sensação de vida’ que April, a protagonista, sentiu. Eu vinha de uma fase na qual conforto e estabilidade eram meus objetivos de vida. Com o passar dos anos, meus desejos mais genuínos foram minados pelo comodismo e algo importante se perdeu: minha coragem e autenticidade. O filme me fez enxergar isto. Adquiri a obra original e me debrucei sobre ela e então decidi escrever a versão teatral. Minha adaptação foca na reflexão sobre o sufocamento dos desejos, a massificação dos valores, o desperdício dos potenciais individuais em virtude de um  modelo de família próspera e feliz estabelecido por interesses econômicos. Mas em si, a história carrega questões femininas urgentes, expostas pela protagonista e que,  lamentavelmente 60 anos depois (o romance foi escrito em 1961),  seguem devastando as mulheres”, revela Pietro, responsável pela dramaturgia e tradução.

“Como a peça é adaptada de um texto literário, é fundamental a presença do recurso narrativo em sua dramaturgia. Mas, ao contrário da presença onisciente de um narrador descolado da ação como mero observador, optamos por tornar cada uma das personagens também narradores em momentos específicos, fazendo com que todos, além de viver a história, também a contem sob sua perspectiva particular. Os figurinos seguem à risca o estilo dos anos 50. Seria impensável transpor o contexto histórico para outra época que não o ano de 1955 original, sob o risco de perdermos a perspectiva do papel da mulher na sociedade e quanto a personagem April se encontra à frente de seu tempo. Quanto à trilha sonora, ela já não terá tanto esse compromisso. Uma combinação de canções e, mais intensamente, temas minimalistas, comporão a atmosfera sonora de crescente dramático que o texto pede”, informa Pâmio. 

Ficha técnica:

Título Original: Revolutionary Road, Romance De Richard Yates. Dramaturgia e tradução: Fabrício Pietro. Colaboração dramatúrgica: Erica Montanheiro e Marco Antônio Pâmio. Direção: Marco Antônio Pâmio. Elenco: Andréia Horta, Fabrício Pietro, Erica Montanheiro, Iuri Saraiva, Martha Meola, Ricardo Ripa, Luciano Schwab, Aline Jones, Julia Azzam e Lucas Amorim. Direção de Produção: Danielle Cabral. Direção de movimento: Marco Patrocínio: Papírus. 

Serviço:

JARDIM DE INVERNO – Estreia dia 11 de outubro
Classificação: 14 anos. 
Ingressos: R$ 50 (inteira); R$25 (meia-entrada).
Temporada: De 11 de outubro a 17 de novembro. Sexta 21h30, sábado 21h e domingo 20h.
Teatro Raul Cortez  – Rua Dr. Plínio Barreto, 285 - Bela Vista, São Paulo.
Bilheteria: De terça a quinta, das 15h às 19h; e de sexta a domingo, das 15h até o início do espetáculo (Não abre aos feriados).
Informações: (11) 3254-1633. 

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Sobre Deise Sabbag

Jornalista formada pela Faculdade Cásper Líbero. Responsável por matérias especiais para o caderno B e titular de uma coluna no Diário Popular. Redatora especial e redatora de moda do City News, do grupo DCI, que posteriormente adquiriu o Shopping News e o Jornal da Semana. Idealizou e editou o Todamoda, que foi o primeiro caderno totalmente dedicado à moda no Brasil. Responsável pela execução de edições diárias em feiras nacionais de moda, como Fenit, Feninver, Feira de Moda de Fortaleza. Cobertura Internacional e pesquisas de tendências dos desfiles de alta-costura e prêt-à-porter em Paris, Roma, Milão e Londres. Docente do primeiro curso para formação de produtores de moda, ministrado pelo Senac. Foi membro do Conselho de Moda da Faap. Autora de três livros: “A Moda dos Anos 80”, “Na Moda de Corpo e Alma” e “Beleza e Qualidade de Vida de A a Z”.

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