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Modos e Modas é o blog da Jornalista Deise Sabbag. Inspirado nas tendências com possibilidade de alcançar as ruas e focado nas tendências adequadas ao biotipo brasileiro. Deise é autora de três livros: “A Moda dos Anos 80”, “Na Moda de Corpo e Alma”, e “Beleza e Qualidade de Vida de A a Z”, glossário reunindo os principais verbetes do setor.
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Linguagem artística bem afiada ganha exposição inédita

Written By Deise Sabbag on terça-feira, 8 de janeiro de 2019 | janeiro 08, 2019




Angela Detanico e Rafael Lain são artistas que adotam a linguagem como tema e objeto de sua obra. A partir de 19 de janeiro de 2019, a  dupla  apresenta Meteorológica, mostra realizada no Espaço Cultural Porto Seguro, em São Paulo.

Com curadoria de Rodrigo Villela, a expo apresenta  um conjunto de 14 trabalhos, a maior parte deles instalações inéditas, criadas a partir das mais variadas linguagens artísticas. Vídeos, textos, animações, objetos, esculturas e instalações conduzem o visitante a um processo de reflexão e constituição do conhecimento.

“A dupla Detanico Lain parte de uma pesquisa de representação para a criação de uma linguagem rica de significados e repleta de poesia”, informa o curador. “Muitos dos trabalhos dialogam diretamente com o nosso espaço. O percurso, por si só, possui uma narrativa própria. A mostra ganha corpo e reverbera na dimensão do aqui e agora”, completa.

Transparência x Opacidade

Em uma área do Espaço Cultural Porto Seguro,  que é ao mesmo tempo interna e externa, um trabalho site-specific já  instiga a curiosidade de quem trafega  pela rua. No corredor envidraçado e panorâmico que conecta dois dos pavimentos do centro cultural, colunas de larguras diversas em vinil preto sucedem umas às outras. A alternância entre transparência e opacidade traz ritmo à entrada da luz no espaço e também entre o dentro e o fora. As faixas de diferentes larguras são na verdade um alfabeto criado pelos artistas e apresentam ao público o título da exposição: Meteorológica.


“O nome da mostra vem de um tratado homônimo de Aristóteles, em que o filósofo grego fala das coisas físicas do mundo natural. São teorias criadas pela observação e descrição dos fenômenos físicos,  materiais, do planeta. Essa é uma ideia que permeia toda a exposição”, destaca Angela Detanico. “Nessa mostra, tentamos criar um microcosmo. Nesse sentido, fazemos referência também ao Japão, adotando uma concepção japonesa do jardim, marcado por um espaço reduzido, mas que evoca a paisagem das montanhas, dos mares, do oceano”, complementa Rafael Lain.

Roteiro da Mostra

Logo na entrada principal do espaço expositivo, sobre uma parede inclinada, a projeção de Cachoeira do céu (2018), vídeo que parte do procedimento de “alongar” verticalmente os pixels de uma fotografia digital do céu, desenhando sobre o suporte uma cachoeira de luz. Em seguida, o visitante se depara com Da luz ao paraíso (2018), escultura em aço patinável,  que traz um percurso gráfico entre  dois bairros paulistanos, configurado conforme sua topografia e seguindo um trajeto afetivo, opção de caminhada dos dois artistas, que já viveram em São Paulo. À frente, Analema (2015) poema escrito na forma de um calendário infinito, em que cada letra corresponde a um dos 365 dias do ano. O percurso da escrita na parede remete à figura que simboliza o infinito.


Na mesma sala, Ulysses (2017), uma animação construída com o texto do romance homônimo de James Joyce. As palavras dão forma a uma silhueta humana, que parece caminhar, apesar de estar fixa em um ponto único. A história avança a cada passo do personagem - a sequência de passos revelando a sequência de frases. Uma jornada tal qual a de Leopold Bloom, protagonista do autor irlandês, que, ao longo de 18 horas,  transita pelas ruas de Dublin de 1904.

No mezanino, Nuvens de São Paulo (2018), vídeo projetado em uma das paredes,  que traz um poema de Memórias sentimentais de João Miramar, romance marco do modernismo brasileiro, obra-prima de autoria de Oswald de Andrade. Com diferentes graus de desfoque, as palavras flutuam no ar  e aos poucos esvanecem.


Ao seu lado, 28 luas (2014), vídeo de 28 minutos que traz o ciclo de 28 dias da lua formado por frases do livro Sidereus nuncius, obra do século XVII, de Galileu Galilei.  Esta é considerada o primeiro tratado científico baseado em observações astronômicas realizadas com um telescópio, com uma descrição minuciosa da superfície da lua. As frases aparecem e desaparecem em um movimento de foco e desfoco, que recria a experiência da observação de um corpo celeste através de uma luneta.

Sob os céus, o mar. Formada com minúsculos grãos de sal, a instalação Onda (2010) apresenta a própria palavra que lhe dá título por meio de um alfabeto criado pela dupla. De forma metalinguística, a nova linguagem é caracterizada por ondas de diferentes comprimentos. No sistema,  inventado pelos artistas, a letra A, por exemplo, é uma onda curta, um pequeno suspiro. Já a letra Z, no fim do alfabeto, é uma onda larga, mais longilínea. No caso da obra, quatro curvas concretizam a palavra onda.

Visita que segue...


No subsolo do Espaço Cultural Porto Seguro, o visitante se depara com Quadrado branco, traduções visuais e em movimento de três poemas do japonês Kitasono Katue, um dos mais importantes poetas de vanguarda do Japão –Espaço monótono, Un autre poème e Gestalt do branco.

Mares da lua (2018) é uma videoinstalação onde nomes como Mar da TranquilidadeMar da ChuvaMar das Ilhas etc são projetados sobre o chão. Os termos designam planícies basálticas que, vistas da terra, formam manchas escuras na superfície da lua – onde, por algum tempo, acreditou-se que houvesse água. Como gotas, pequenos feixes de luz mancham o piso em círculos de pedriscos brancos, que enunciam cada um dos “mares”, pouco a pouco, quase como um sussurro, ao mesmo tempo em que remetem aos jardins japoneses da tradição zen budista.

Pintura mural sobre um fundo preto, Alguma coisa está fora da ordem (2018) traz a frase que dá título à obra escrita segundo o sistema “timezonetype”. Criado em 1802 pelo astrônomo e físico norte-americano Nathaniel Bowditch, o sistema associa uma letra do alfabeto a cada uma das 24 divisões de fuso horário do globo. Na obra, o resultado é um novo mapa-múndi, mescla de familiaridade e estranhamento com a representação cartográfica do planeta Terra.

Não por acaso, logo ao lado, Ruído branco (2007), vídeo que toma uma imagem fotográfica feita por satélite da floresta amazônica, que vai sendo apagada gradualmente. Aos poucos, a mata é tomada por pontos brancos, até desaparecer, ao mesmo tempo em que o aumenta o “ruído branco” da instalação – termo usado para designar sons que o ouvido humano não consegue distinguir como portadores de algum significado, ou cuja fonte não pode ser identificada.

Final imperdível

Na última sala da exposição são apresentados os principais registros documentais da produção da dupla: vídeos especialmente desenvolvidos para a exposição e catálogos das principais exposições mundo afora.

Por fim, já no pátio externo, duas obras: Percurso (2018), escultura metálica construída mais uma vez por um dos códigos concebidos pela dupla. A palavra que a intitula ganha forma a partir de um sistema de equivalência entre barras metálicas e a ordem alfabética. Na fachada do prédio, Entre o ontem e o amanhã (2018) uma grande instalação de neon que chama a atenção para seu traçado irregular: é o registro gráfico, tridimensionalizado pela dupla, da linha de fuso horário que determina a mudança de data no calendário, passando de um determinado dia para o seguinte. No mesmo mundo, na mesma hora, nesta linha imaginária é possível que o ontem conviva com o amanhã.

Para Rodrigo Villela, curador da mostra, "a poética da dupla se dá tanto pela abordagem frontal como pelas temáticas contundentes – ao tratar de questões universais de maneira tão peculiar, os artistas transformam conceitos muitas vezes eruditos em obras de uma força visual potente, que dialogam com diferentes tempos, geografias, histórias e literaturas. Vem daí muito da força e do interesse que despertam”, aponta.

Sobre os Artistas
Angela Detanico e Rafael Lain trabalham juntos desde 1996. Semiologista e designer gráfico, nascidos respectivamente em 1974 e 1973, em Caxias do Sul (RS), moram e atuam em Paris. Seus trabalhos, em grande parte conceituais, mesclam gráficos, textos, sons e vídeos, quase sempre imbuídos de referências científicas, matemáticas e literárias.

“A gente só diz que um trabalho acontece quando os dois se apropriam muito de determinado processo, e isso passa por intensos  diálogos e discussões. É uma pesquisa que nasce da curiosidade pelo mundo.  Pesquisamos para tentar dar conta do mundo em que a gente vive por meio da arte”, afirma Detanico. “Mesmo que seja uma prática artística, o percurso é realmente filosófico”, completa Lain.

Em 2002, a dupla participou de uma residência artística na capital francesa, no Palais de Tokyo. Dois anos depois, venceu o Nam June Paik, um dos mais prestigiados prêmios internacionais. No mesmo ano, em 2004, Angela e Rafael participam da Bienal de São Paulo, feito que se repete nas duas edições seguintes, em 2006 e 2008. Nesse meio tempo, em 2007, representaram o Brasil na 52ª Bienal de Arte de Veneza.

Ainda em Paris, a dupla deu início a um projeto de colaboração com dois coreógrafos de Quioto, o que rendeu ao casal algumas temporadas no Japão, e, consequentemente, a participação em bienais e exposições pelo país asiático.
“A exposição começou a ganhar forma depois de nossa visita ao espaço. Os desníveis, que para muitos poderiam soar como um desafio, sugeriram uma topografia para a ideia que tínhamos em mente, a de construção de uma paisagem artificial, da racionalização do ambiente natural, tal qual um jardim japonês”, afirma Lain.  
No Brasil, os artistas  já participaram de uma série de exposições coletivas e individuais.

SERVIÇO

Meteorológica, mostra de Angela Detonico e Rafael Lain  
Local: Espaço Cultural Porto Seguro 
Endereço: Al. Barão de Piracicaba, 610. Campos Elíseos – São Paulo, tel.(11)   3226-7361
Período expositivo: de 19 de janeiro até 7 de abril
Visitação: de terça a sábado, das 10h às 19h; domingos e feriados, das 10h às 17h
Entrada gratuita 

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Sobre Deise Sabbag

Jornalista formada pela Faculdade Cásper Líbero. Responsável por matérias especiais para o caderno B e titular de uma coluna no Diário Popular. Redatora especial e redatora de moda do City News, do grupo DCI, que posteriormente adquiriu o Shopping News e o Jornal da Semana. Idealizou e editou o Todamoda, que foi o primeiro caderno totalmente dedicado à moda no Brasil. Responsável pela execução de edições diárias em feiras nacionais de moda, como Fenit, Feninver, Feira de Moda de Fortaleza. Cobertura Internacional e pesquisas de tendências dos desfiles de alta-costura e prêt-à-porter em Paris, Roma, Milão e Londres. Docente do primeiro curso para formação de produtores de moda, ministrado pelo Senac. Foi membro do Conselho de Moda da Faap. Autora de três livros: “A Moda dos Anos 80”, “Na Moda de Corpo e Alma” e “Beleza e Qualidade de Vida de A a Z”.

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